Humor Tadela fechou por falta de dinheiro, diz criador

Criado em 1995, o Humor Tadela fechou. O site de humor  é um dos pioneiros na web brasileira. Foi trending topics no Twitter durante toda a última terça-feira, quando internautas ficaram lembrando experiências suas no site. O criador, Sergio Batista, de 50 anos, só havia twittado um “It´s over” (acabou) para explicar o motivo. Em entrevista a este blog, ele coloca tudo em pratos limpos: faltou dinheiro.

A crise, diz, vem desde o início: o estouro da bolha da internet, em 2000, reduziu o número de funcionários de 21 para três. Em 2008, uma invasão hacker deixou o site por três meses fora do ar e a audiência caiu. Daí veio uma dívida enorme no banco, “capaz de atravessar algumas gerações”. “Depois de perder muito dinheiro com esse negócio, resolvi fechar e tentar fazer alguma coisa mais lucrativa.”

Na entrevista abaixo, Batista conta que venderá a marca Humor Tadela para pagar funcionários, reclama da falta dinheiro para publicidade na internet, opina que a nova geração do humor na internet dificilmente irá sobreviver “por falta de receita”  e diz que é “pouco provável” que os arquivos de piadas do Humor Tadela voltem para a rede. Veja:

Por que o Humor Tadela foi fechado? Motivo foi falta de audiência, patrocínio, preço caro da hospedagem…?
O nosso modelo de negócio, baseado exclusivamente em publicidade, é um modelo fracassado. Principalmente em se falando de sites de humor, que tem de enfrentar o preconceito dos anunciantes que não querem associar a sua marca a um conteúdo irreverente e satírico. Durante esses 15 anos que estivemos no ar, enfrentamos várias crises. Costumava dizer que nos tornamos uma empresa especializada em enfrentar crises que faz piadas nas horas de folga. Chegamos a ter 21 funcionários em 1999 e 3 no ano 2000, logo após o estouro da bolha. Nessa época, tivemos que fazer tantos malabarismos para sobreviver que chegamos a tirar do ar todos os conteúdos que tinham grande audiência, porque não conseguiamos pagar o custo de hospedagem.

Tentamos várias iniciativas paralelas, como a venda de conteúdo para celulares (que foi um sucesso inicialmente), publicação da revista Humor Tadela, a MegaLojinha, um site de e-commerce, conteúdo para jornais, etc… Mas essas ações só serviram para tapar buraco. Depois de 2008, quando tivemos uma invasão de hackers e chegamos a ficar 3 meses fora do ar, a queda de audiência somada à necessidade de renovação consumiu recursos financeiros que não tínhamos e acabamos contraíndo uma dívida impagável com os bancos. Quer dizer a dívida nós pagamos, o que não conseguimos pagar foram os juros.  Depois de perder muito dinheiro com esse negócio, resolvi fechar e tentar fazer alguma coisa mais lucrativa.

Como estava a audiência atual do Humor Tadela? Quando foi o pico de popularidade do site?
Ultimamente estávamos com 1 milhão de unique visitors por mês e 20 milhões de page views mensais. Muito distantes dos 4 milhões de unique visitors e 280 milhões de pahe views que chegamos a ter em 2006. Mas, infelizmente para o nosso desespero, o sucesso de audiência nunca se reverteu  em sucesso financeiro.

Como viu a repercussão quase um mês depois no Twitter do fechamento do site?
Acho que isso reflete bem a realidade que o negócio vivia nos últimos tempos. O Humor Tadela ”era” um site legal. Embora as pessoas tivessem uma boa lembrança do site, já não estavam habituadas a visitá-lo com frequência. Fico feliz de ter feito parte da infância e da adolescência de muitos jovens de hoje. O carinho do público sempre foi a mola propulsora de nosso negócio. E, se chegamos a ter o sucesso que tivemos, o mérito é todo dele que através do boca a boca divulgou o nosso trabalho para os quatro cantos desse mundo redondo. Frequentemente recebíamos emails de brasileiros do exterior que acessavam o Humor Tadela para “matar a saudade” do Brasil. Segundo o Alexa, o Humor Tadela ainda agora era o quinto site mais acessado em Angola. Também tinhamos um público gigantesco em Portugal e Moçambique.


O Humor Tadela é um dos precursores na internet: no que você acha que ele inovou? E qual legado ele deixa?
Acho que a inovação sempre foi o nosso forte. Fomos o primeiro site de cartões virtuais no Brasil, até onde eu sei fizemos também a primeira newsletter, o Boletim do Humor Tadela, que chegou a ter quase 3 milhões de cadastrados. Em 1999, lançamos a primeira coleção de figurinhas virtuais do mundo, satirizando o sucesso dos bonequinhos Amar é com Aturar é. Na época cheguei a receber a visita de um empreendedor americano que estava prestes a lançar algo do gênero nos Estados Unidos. Também fizemos uma série de jogos exclusivos: Jogo da Bundinha, Quem Sabe, Sobe!, Leilão, Cornograma e muitos outros. E por incrível que pareça, todos eles fizeram um enorme sucesso. O nosso chat com os bonequinhos excluivos também se tornou um dos mais conhecidos do Brasil. Recebia em média 20 a 30 mil visitantes por dia. Acho que um dos motivos de nosso sucesso é ter feito tudo isso de forma bem-humorada e divertida. Quanto ao maior legado que deixamos acho que foi a dívida mesmo – que possivelmente vai ser capaz de atravessar algumas gerações.

Como você vê a oferta de sites de humor hoje no Brasil? Quais serão os herdeiros do Humor Tadela?
Acho que está cada vez mais difícil fazer humor. Parece que o povo tá perdendo paulatinamento o senso de humor. Outro dia recebi o email de uma advogada furiosa, dizendo-se indignada com as piadas de advogados que tinham no site. Dizia ela: “Embora às vezes eu achasse que vocês pegavam pesado, eu sempre adorei as piadas do Humor Tadela, mas esculachar com os advogados é o cúmulo do desrespeito com as instituições do país.” Depois dessa, cheguei à conclusão de que, na cabeça de grande parte das pessoas, fazer piadas é igual a fazer troca-troca, só é gostoso quando é a nossa vez de ficar por cima.

Eu nunca tive preconceitos em relação a fazer piadas de nenhuma minoria. Até por isso, um dos motes do Humor Tadela sempre foi falar mal de si mesmo. Queríamos com isso mostrar que, na nossa visão,  o humor sempre estava acima desses preconceitos. Mas me sentia encabulado ao fazer piadas com deficientes. Até que um dia, tive a oportunidade de ser DJ em uma festa de final de ano de crianças especiais. Ao conviver com eles aquelas poucas horas, percebi claramente que o maior sonho deles era ser tratado como uma pessoa normal. E concluí então que o meu sentimento de pena é que era preconceituoso. Afinal, pra que serve o nosso senso de humor se não pudermos utilizá-lo quando mais precisamos dele?

Admiro muito essa nova geração de talentos que está chegando para fazer humor na internet, mas a longo prazo acho que eles não vão sobreviver, a menos que consigam fontes alternativas de receita. E também tem as concorrências desleais que existem por aí, como o YouTube, para ficar num só exemplo. Nós gastamos dias para produzir uma animação e quando colocamos no ar, meia hora depois ela está no YouTube, e vai ter mais acesso lá, do que no seu próprio site. Você arca com os custos e o YouTube fica com a receita. Acho isso um modelo perverso que desincentiva a produção de novos conteúdos na internet.

Há alguma chance de o arquivo do site voltar ao ar, mesmo sem ser atualizado?
Acho pouco provável, mas não impossível.

Você tem algum novo projeto para a internet? Pode, por favor, adiantar?
Além de vender a marca e os domínios para pagar as dívidas e principalmente os salários atrasados, estou em busca de investidores para dois novos projetos: MondoPedia, a enciclopédia do pensamento e o Mooleky, um sistema totalmente inovador de monitoramento de sites, ambos de amplitude mundial. Também estou escrevendo um novo livro: Não Trabalhe, Divirta-se!, que trata basicamente de como conseguir se divertir fazendo aquilo que a maioria das pessoas detesta. Talvez um dia eu venha a escrever a história do Humor Tadela, uma tragi-comédia, cujo final todo mundo já conhece!

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